Entre Quadrantes e Talheres: Uma História de Manias e Mistérios
Assim como cada bicho tem seu passo, nós, humanos, temos nossas manias. Nosso jeito especial de fazer as coisas — ou de não fazer. E te confesso, meu querido leitor: tanto o fazer quanto o não fazer têm o seu carimbo genético... será?
Vamos começar com uma observação que a mulher de um amigo nosso nos contou ontem, em um aniversário que minha mulher, minha filha e eu, acredite se quiser, eu fui. Digo isso porque o meu sofá, o controle da TV e eu estamos cada vez mais ligados.
A mania da perfeição nos detalhes desenvolve uma visão de raio-X, capaz de detectar a olho nu uma diferença de milímetros na quebra harmoniosa da colcha da cama em direção ao sagrado chão do aposento.
Essa colcha foi colocada pela secretária, observando todas as dimensões da cama, considerando a força gravitacional, a inclinação do eixo da Terra e até a corrente de vento que passa pela fresta da janela. Todos os parâmetros são levados em conta para que essa peça tão imaculada repouse milimetricamente igual nos três cantos da cama.
E não para por aí. O marido ainda faz uma vistoria e dá o “ok”, encerrando a delicada operação de cobrir o aconchegante lugar do merecido repouso do casal.
A certeza da missão cumprida só termina quando ela, ao passar pelo corredor e de ponta de olhos, observa como se estivesse medindo quadrantes e, com a velocidade de um computador quântico, determina: — Maria, a colcha está torta. Dois graus à direita, no quadrante sul.
Maria deve pensar: que porra é grau e quadrante? Mas, com a ajuda do patrão, depois de uma análise detalhada, a correção é feita e a normalidade volta — pelo menos para Maria.
Agora, meu estimado leitor, você acha que o marido sai impune das devidas correções de estética e posicionamento? Não, claro que não. Afinal, uma ex-aluna da professora Noilde Ramalho jamais permitiria que um talher fosse lavado depois dos pratos.
— Absurdo! Você está furando a fila da lavagem, e isso é grave.
E o marido, com o pano de prato na mão, pergunta: — Eles são preferenciais? Agora é idoso, gestante e talher?
— Isso mesmo, meu querido. E vire o pano de prato: a figura da segunda-feira está de ponta cabeça.
O marido vai tomar banho sabendo que a toalha deve ser dividida em três áreas:
— Área 1: cabeça,
— Área 2: corpo,
— Área 3: furico.
E a explicação é simples: a parte da toalha que corresponde à Área 3 fica sempre na barra da toalha que tem um detalhe.
Observações dessa natureza seriam de grande valia no tempo da Guerra Fria. Mensagens poderiam ser trocadas entre espiões, pois na Área 3 ninguém iria procurar informações — por tratar-se de um lugar destinado ao olho cego.
Agora entendo por que, depois do banho, ao enxugar o rosto, pensava: há algo errado com esse sabonete.
Acho que esses detalhes nos divertiram tanto que aqui estou, registrando uma noite muito agradável e rica em conhecimentos, que começou com o freezer de última geração que chegou amassado e com o motor queimado, os balanços e cochilos do meu sogro — avô do aniversariante — e um caso incompreendido que envolve um cavalo, um síndico e a justiça. Bom, melhor do que isso, só se eu tivesse levado o meu sofá.
Luciano Fernandes
Enviado por Luciano Fernandes em 28/05/2025