Desafiando Popó (e a Morte por Trinta Contos)
Não sei se o amigo já viu até que ponto o desespero humano por dinheiro pode chegar. Eu, infelizmente, tenho autoridade para falar sobre isso — embora seja muito contra a minha vontade. Vivi alguns anos naquela eterna luta pela sobrevivência, e posso dizer que fui passando de uma pessoa maravilhosa para um... sem valor. Entendeu, né?
Então, outro dia desses, comuniquei à minha mulher que iria me preparar para desafiar o Arcelino numa luta. E ela, sem pestanejar:
— Qual Arcelino? Aquele baixinho e manco do 401?
— Não, querida. O Arcelino de Freitas, o Popó! Aquele lutador da Bahia que tá ganhando dinheiro batendo nos outros — e fazendo eles ganharem um trocado também. Sabe quem é?
— Sei! Aquele que bateu no Bambam com vassoura e tudo, né?
— Exatamente.
— E por que você não desafia o Maguila? Ele é da sua idade e do seu tamanho.
— Querida, eu não tô procurando alguém pra trocar um par de sapatos. Tô procurando alguém pra trocar socos num ringue! E outra coisa: o Maguila já faleceu. E, não, não venha me perguntar se foi comida.
Nessa altura, minha mulher finalmente fez a pergunta que realmente importava. Você talvez pense que ela queria saber sobre os riscos, se eu poderia ficar com trauma ou começar a tremer como se estivesse tocando tarol. Mas não. A pergunta foi direta:
— Quanto pagam?
— Acho que uns trinta mil. Em caso de morte, trinta e dois.
— Será que você morre mesmo ou vai bancar o durão e aguentar até o fim? Porque a diferença é tão pouca... Será que se você conversar com eles, não fecham logo nos trinta e cinco?
— Vou me informar...
Nessa hora, ela e minha filha já escolhiam a cor do calção e o modelo das luvas.
— Pode ser branca mesmo. Ele não vai conseguir acertar nenhum golpe no Popó — completou minha sogra, já medindo se o guarda-roupa cabia no meu escritório.
Pois bem. Me dirigi ao escritório do Arcelino. Ele, muito educado, me convidou para almoçar um bobó de camarão, e acabamos nos tornando amigos. Mas antes de me despedir, preenchi a ficha da luta feminina... com o nome da minha sogra, da minha mulher e da minha filha.
Afinal, noventa mil são noventa mil.
Luciano Fernandes
Enviado por Luciano Fernandes em 18/05/2025
Alterado em 19/05/2025