Ou Vai Ou a Cerca Cai: Crônicas com Humor
Textos que derrubam cercas e arrancam risos e reflexões.
Capa Meu Diário Textos Áudios E-books Fotos Perfil Livros à Venda Prêmios Livro de Visitas Contato Links
Textos
O Eu Aposentado.
O som da experiência

Você deve pensar que sou um aposentado sem graça, sofrendo com dores em todas as juntas. Meu amigo, você errou. Não, não é em todas as juntas – só naquelas que emitem som quando me levanto, sento, abaixo ou rolo. Ou seja, estou a um passo de virar uma sirene ou um gemido de filme pornô, dependendo do esforço.

Pequenos desafios do dia a dia

Calçar o tênis, uma atividade banal para a maioria, se tornou uma maratona com direito a corrida de obstáculos para mim e outros felizardos da chamada “melhor idade”. Coisas simples ganharam ares de aventura. Fazer a barba, por exemplo, passou a exigir planejamento estratégico e ampla divulgação, como se eu fosse embarcar numa volta ao mundo – e só pelo uso dessa expressão já deu para perceber que minha última referência de viagem foi tirada da revista Manchete… ou foi Seleções? Não lembro!

Os novos sócios da aposentadoria

Os remédios, que antes só entravam na minha rotina para curar ressaca, agora são sócios do meu orçamento, dividindo espaço com o cartão de crédito e a minha eterna gratidão. Já as ligações que antes chegavam me chamando para a noitada, hoje se resumem a “amigos” querendo me convencer a refinanciar o consignado – o outro sócio que abocanha meu faturamento. Todas essas movimentações do passado, carnaval, micaretas, boates... tudo isso foi trocado por um rolê tranquilo em restaurantes, bares, livrarias, cinemas e teatro – naturalmente, se tudo isso estiver disponível dentro do shopping. Mas, meu amigo, o que me seduz mesmo é o sofá e minha querida amiga Smart TV. Temos uma relação fraternal, pois a TV me suporta trocar de canal a cada dois minutos. Basta não simpatizar com o ator ou não gostar do timbre de voz do dublador para apagá-los de vez da minha vida. Coisa que aproveitei e fiz com uma imensa quantidade de políticos, apresentadores, youtubers e mais um balaio de gente, incluindo jogadores de futebol metidos a bestas.

Amor e o poder do controle remoto

Sorte, e isso eu fui agraciado com uma porção extra, é ter uma mulher como a minha: linda, inteligente e, pasmem, 16 anos mais jovem que eu e que, de bom grado, me passou o comando do controle remoto sem protestar, nem interferir no meu permanente tira e bota de canal. É como se ela pensasse: "Vou deixá-lo com o controle, pelo menos fica quieto."

Quando a idade te encontra

O interessante é que a velhice vai chegando devagar e você não nota, até que um belo dia começa a ser chamado de senhor. No meu caso, foi mais constrangedor. Como eu era supervisor administrativo de um curso de odontologia, os alunos passaram a me chamar de Tio Lu. Um modo carinhoso, eu sei, mas se eu fosse um jovem de 30 anos, seria Mano Lu. E olha que até All Star vermelho eu usava para prolongar ao máximo ser chamado de Vô Lu.

Editando o envelhecimento

No fim das contas, a idade chega para todos – alguns enfrentam, outros negam, eu edito. Ajusto a trilha sonora do meu envelhecimento com o controle remoto, escolho quem permanece na minha tela e sigo trocando de canal sempre que a vida tenta me chamar de 'Vô' antes da hora.
Luciano Fernandes
Enviado por Luciano Fernandes em 07/04/2025
Comentários